"Um blog que discorre sobre cristianismo, apologética, cinema e outros assuntos desinteressantes..."



quinta-feira, 22 de março de 2012

Toda discussão teológica é do diabo?


Lutero diante do tribunal religioso de Worms, Alemanha, defendendo a doutrina da justificação pela fé


Por  Augustus Nicodemus Lopes
De vez em quando leio comentários de cristãos nas mídias sociais dizendo, “eu sou mais a Bíblia, eu só quero Jesus, esse negócio de discussão doutrinária só divide a igreja, é coisa de homem e do diabo”.
É claro que eles estão certos se a discussão doutrinária for movida por interesse mercenários e pela luta pelo poder. Todavia, este tipo de juízo generalizado revela uma falsa piedade enorme e uma ignorância ainda maior.
Se hoje estes queridos têm a Bíblia no Brasil para ler em português e conhecem o Jesus que ela ensina é por que:
1) A Igreja reconheceu os 66 livros somente depois de muita polêmica contra Marcião e Montano no séc. II a III; sem isto, nem Bíblia teríamos ou então, uma mutilada;
2) Os Reformadores quebraram o pau na Idade Média para dizer que a Bíblia é a revelação final de Deus e com isto conseguir que ela voltasse para as mãos do povo;  sem isto, estaríamos escutando missa em latim até hoje e sem uma Bíblia em nossa língua para conferir;
3) Comitês de tradução brigam e disputam teologia para saber qual a melhor tradução do grego e hebraico para o português; imagino que estes irmãos “piedosos” não lêem nem grego e nem hebraico e que dependem do português para ler a Bíblia;
4) Teólogos e mestres crentes lutaram e brigaram contra os liberais para que as igrejas ficassem com o Evangelho puro acerca de Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Sem estas disputas teológicas, estaríamos reverenciando um Jesus diferente daquela da Bíblia.
Portanto, acho que estes irmãos estão simplesmente cuspindo no prato em que comem todo dia, ao condenar as disputas teológicas ao mesmo tempo que lêem sua Bíblia em português.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Que diferença faz se Deus existe?


por William Lane Craig


As pessoas ocidentais por viverem em contextos de origem cristã não conseguem perceber a importância da existência de Deus. Então, devemos mostrar as implicações da existência de Deus para pessoas descrentes. Na Rússia está havendo um crescimento do cristianismo devido “a prova do contrário”, pois o povo viu que o marxismo por tantos anos não deu certo.

Filósofos existencialistas como Sartre analisaram que de fato a inexistência de Deus torna a vida sem sentido. Apesar disso não ser uma prova em favor da existência de Deus, isso mostra a importância da pergunta. Ninguém que conhece as implicações do ateísmo pode ignorar a pergunta “que diferença faz se Deus existe”, pois sem Deus a vida humana é absurda: a vida não tem sentido, valor ou propósitos superiores e definitivos.

Sentido: significado (porque algo importa)
Valor: bem ou mal (certo ou errado)
Propósito: alvo (razão de algo existir)

Minha defesa é que se Deus não existe, então tais coisas não existem, além de em nossas próprias cabeças. Não estou dizendo que ateus são imorais ou não tem alvos, mas que segundo o ateísmo todas as coisas são somente ilusões subjetivas.

Consideremos a questão da imortalidade. Se Deus não existir tanto o homem quanto o universo estão fadados à morte, ao “não ser”. Conforme diz o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre: “Uma vez perdida a eternidade, não faz muita diferença se isso demorar muitas horas ou muitos anos”. A consequência disso é que a vida se torna absurda:

1) Sem sentido final: se toda pessoa deixa de existir quando morre, qual a diferença final faz nossa vida. Certamente, podemos ter influência relativa, mas nenhuma importância absoluta. Em última análise, não faz diferença e a humanidade não tem nenhuma diferença de um bando de mosquitos. Mas mesmo tendo imortalidade, não é só disso que o homem precisa para ter sentido. O homem precisa de imortalidade e de Deus e se Deus não existe, o homem não tem nenhum dos dois.

2) Sem valor: sem imortalidade e se tanto o bom quanto o mal tem o mesmo fim, então não existe razão para sermos morais. “Não pode haver virtude sem imortalidade” (Dostoievski). Dizer que a moralidade flui de interesses comuns (uma mão lava outra) é uma resposta simplista que ignora que os interesses de algumas pessoas vão diretamente contra o de outras. Sem imortalidade não há nenhum razão objetiva para moralidade. E se Deus não existe, não há um padrão objetivo de moralidade, tornando-se só uma construção do gosto pessoal, da evolução ou da sociedade.

3) Sem propósito: se tudo está fadado à morte, então não há nenhum propósito na vida ou no universo. Se Deus não existe, a vaidade descrita em Eclesiastes é verdade: “Porque o que sucede aos filhos dos homens, isso mesmo também sucede aos animais, e lhes sucede a mesma coisa; como morre um, assim morre o outro; e todos têm o mesmo fôlego, e a vantagem dos homens sobre os animais não é nenhuma, porque todos são vaidade” (Eclesiastes 3:19). Se a vida acaba com a morte não temos um propósito final com a vida. E, além disso, mesmo com a imortalidade, mas sem Deus, o homem continuaria a sendo um mero acidente cósmico, um produto casual de matéria, tempo e chance, sem razão nenhuma de existência. Se Deus não existe você não passa de um aborto da natureza, lançados sem propósitos para viverem uma vida sem propósito.

Se Deus não existe, então tudo o que temos é o desespero. Como Schaeffer diz: “Se Deus está morto, então o homem também o está”. O filósofo ateu Bertrand Russell, por exemplo, sugeriu que devemos construir nossas vidas “sob o firme fundamento do desespero incessante”. A vida consistente com o ateísmo é uma vida infeliz. Toda felicidade de um ateu é uma inconsistência. Nietzsche, filósofo existencialismo, em uma história previu as consequências do ateísmo:

Não ouviram falar daquele homem louco que em plena manhã acendeu uma lanterna e correu ao mercado, e pôs-se a gritar incessantemente: “Procuro Deus! Procuro Deus!”? – E como lá se encontrassem muitos daqueles que não criam em Deus, ele despertou com isso uma grande gargalhada. Então ele está perdido? Perguntou um deles. Ele se perdeu como uma criança? Disse um outro. Está se escondendo? Ele tem medo de nós? Embarcou num navio? Emigrou? – gritavam e riam uns para os outros. O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os com seu olhar. “Para onde foi Deus?”, gritou ele, “já lhes direi! Nós os matamos – vocês e eu. Somos todos seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos beber inteiramente o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? Que fizemos nós ao desatar a terra do seu sol? Para onde se move ela agora? Para onde nos movemos nós? Para longe de todos os sóis? Não caímos continuamente? Para trás, para os lados, para a frente, em todas as direções? Existem ainda ‘em cima’ e ‘embaixo’? Não vagamos como que através de um nada infinito? Não sentimos na pele o sopro do vácuo? Não se tornou ele mais frio? Não anoitece eternamente? Não temos que acender lanternas de manhã? Não ouvimos o barulho dos coveiros a enterrar Deus? Não sentimos o cheiro da putrefação divina? – também os deuses apodrecem! Deus está morto! Deus continua morto! E nós o matamos! Como nos consolar, a nós, assassinos entre os assassinos? O mais forte e sagrado que o mundo até então possuíra sangrou inteiro sob os nossos punhais – quem nos limpará esse sangue? Com que água poderíamos nos lavar? Que ritos expiatórios, que jogos sagrados teremos de inventar? A grandeza desse ato não é demasiado grande para nós? Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses, para ao menos parecer dignos dele? Nunca houve ato maior – e quem vier depois de nós pertencerá , por causa desse ato, a uma história mais elevada que toda a história até então!” Nesse momento silenciou o homem louco, e novamente olhou para seus ouvintes: também eles ficaram em silêncio, olhando espantados para ele. “Eu venho cedo demais”, disse então, “não é ainda meu tempo. Esse acontecimento enorme está a caminho, ainda anda: não chegou ainda aos ouvidos dos homens. O corisco e o trovão precisam de tempo, a luz das estrelas precisa de tempo, os atos, mesmo depois de feitos, precisam de tempo para serem vistos e ouvidos. Esse ato ainda lhes é mais distante que a mais longínqua constelação – e no entanto eles cometeram! – Conta-se também no mesmo dia o homem louco irrompeu em várias igrejas , e em cada uma entoou o seu Réquiem aeternaum deo. Levado para fora e interrogado, limitava-se a responder: “O que são ainda essas igrejas, se não os mausoléus e túmulos de Deus?”. (Nietzsche, A Gaia ciência, fragmento 125)

A cosmovisão cristã fornece tanto a existência de Deus, quanto a imortalidade, necessárias para uma vida significativa e objetivamente feliz. Então, se só tivéssemos isso, parece muito mais razoável escolher o cristianismo. Conforme a aposta de Pascal: “quem apostar na existência de Deus, se ganhar, é evidente que tudo ganha, mas caso perca, nada perde. Trata-se de um jogo em que se arrisca o finito para ganhar o infinito”.

Você consegue ver agora a importância da pergunta “Que diferença faz se Deus existe?”? Considere-a atentamente.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Cinema 2012: A Invenção de Hugo Cabret

(Hugo de Martin Scorsese, EUA/França 2011)

Que Martin Scorsese é um apaixonado e obcecado por cinema e tudo o que é parte dele, isso todo mundo sabe (pelo menos os cinéfilos).

Que Martin Scorsese é um gênio, tendo uma filmografia ímpar com filmes totalmente diferentes e ainda assim com uma "marca registrada" sua, isso todo mundo também sabe (principalmente os cinéfilos).

Que Georges Méliès foi um pioneiro que viu o cinema nos seus primórdios como algo fantástico, além da nossa imaginação, com um leque de infinitas possibilidades, como um moleque que se delicia com um brinquedo novo, que entendeu que o cinema, como forma de arte, é antes de tudo uma máquina de fabricar sonhos e tornar alguns deles realidade através de imagens em movimento, que criou alguns filmes inesquecíveis que servem de referência para QUALQUER UM que queira saber o que é cinema ou que queira mexer com isso, bem.......... poucos sabem (inclusive alguns que se dizem cinéfilos).

Sim, Hugo é uma declaração de amor ao cinema - e esta arte está cheia delas. Mas Hugo é algo mais do que isso.

Ao usar o 3D (o melhor desde Avatar, ouso até dizer que em alguns momentos é melhor do que Avatar) embolado em uma trama infanto juvenil, Scorsese vai além da nostalgia, vai além de declarar seu amor pela arte que lhe rende o seu sustento. Scorsese dialoga comigo e com você, expectadores do século XXI totalmente imersos em filmes extravagantes, quase que totalmente virtuais, muitos deles usando a mesma tecnologia que ele usa magistralmente aqui, suplicando que nós não nos esqueçamos do que o cinema já foi um dia e que se hoje podemos nos deleitar com seres azuis de 3m no planeta Pandora ou robôs que se transformam em carros ou que super heróis podem existir de carne e osso, nós devemos isso ao que o cinema um dia foi, ao que caras como Méliès fizeram.

Hugo resgata o prazer que as gerações anteriores tinham de ir ao cinema (e diz que nós também temos que tê-lo), representado pelos olhares de espanto, admiração e fascínio da garota Isabelle que, levada pelo protagonista que dá nome ao filme, descobre um novo mundo, uma nova forma de sonhar. Isabelle sou eu, é você que é cinéfilo que vê justificado, através das lentes poderosas de Scorsese, o amor que sentimos por essa arte e sentimos saudades de quando olhávamos com o mesmo espanto, admiração e fascínio aqueles filmes que figuram na nossa lista de melhores. E Scorsese também discursa dizendo: "sim, é possível sentir o espanto, admiração e fascínio com a tecnologia de que temos hoje desde que lembremos do que o cinema foi um dia e como chegou até aqui", bem como tal discurso também o é para aqueles que vivem de fazer cinema e muitos entopem nossas salas com porcarias sem tamanho, simplesmente porque não entenderam isto ou pior, não querem entender.

E mesmo que hajam defeitos - particularmente penso que o filme não teria falado tão forte comigo se eu não fosse cinéfilo, o que faz do discurso do Marty uma preleção para "iniciados" - ainda assim o filme ecoa forte não só para nós, mas para todas as gerações que virão depois, nesse sentido, Hugo é um testamento de que o cinema, mesmo no formato digital, em 3D absurdamente lindo pode ser (e deve ser) extremamente puro.


Não levou o Oscar, mas e daí? Prefiro que Hugo se torne um Cidadão Kane do que um Shakeaspeare Apaixonado (ou pior ainda, um Crash - No Limite)


E pensar que tudo isso pode ter vindo da simples idéia "quero fazer um filme em 3D". (by Marcelo Serrano)

5/5


segunda-feira, 5 de março de 2012

Parábola sobre zumbis




  Zé Luís


Confesso:

Detesto filmes sobre zumbis, e não é com pouca estranheza que vejo multiplicarem-se produções cinematográficas, séries, jogos eletrônicos, tudo sobre pessoas que, de alguma forma bizarra, continuam andando pela terra após morrerem. De praxe, algum vírus os matam, e sua (in?)existência persiste apenas para alimentar-se dos que ainda vivem. Eles não tem estomago, intestino, paladar, olfato, mas tem um apetite insano pela vida alheia.

Ainda adolescente, assisti no cinema o lançamento “O retorno dos Mortos Vivos” (na verdade, tinha ido assistir Guerra nas Estrelas, mas tinha saído de cartaz, e não ia perder a viagem... droga). Já joguei Resident Evil em diversas plataformas – e vi os filmes também (você deve estar se perguntando: “Se não gosta, porque assiste ou joga?” Boa pergunta...). "Eu sou a Lenda", com zumbis inteligentes e meio vampiros, e um monte de outros que me fogem a mente agora.

Vejo nos zumbis uma parábola sobre o homem caído, o que Adão passou a reproduzir no planeta após sua expulsão do Éden. Viagem da minha parte?

Todos nós somos mortos-vivos, “irremediavelmente” fulminados por um vírus chamado pecado, tornando-nos seres repugnantes.

Já percebeu que um zumbi aceita outro zumbi? É como o inferno que ama outro inferno. Se comunicam e compartilham do mesmo objetivo, embora inconsciente: destruir a vida que ainda existe, militam contra ela. A não-vida que possuem só enxerga a necessidade de ingerir algo vivo, embora isso apenas a destrua, e não traga a eles, o que desesperadamente anseiam: existência genuína.

Não espere deles arrependimento: os mortos não tem consciência, ética ou moral. Vivem suas mortes apenas para seu inexistente estomago, para dar continuidade inexplicável de uma desgraçada morte em movimento. Sempre acho esquisito a surpresa com que pessoas reagem a maldade humana, quando aqueles cometem crueldades e depois dormem em paz: eles são zumbis, não tem uma consciência que incomode-os, por que os mortos não tem isso.

Para os que já estão mortos, não há grande pranto ou dor quando são destruídos ou destroem: os zumbis não são aquilo que chamamos humanos, são uma distorção do que um dia foi a vida e o grande atrativo das histórias sobre zumbis é acabar com eles indiscriminadamente: é um bem para a humanidade destruí-los em definitivo. Antes eles do que nós.

Mas então a cura é descoberta: uma chance de recuperação! Corre o boato por toda a Terra que um único ser deixou entre os povos o antidoto de todo o mal que o vírus causa, e zumbis mortos e putrefados voltam a vida. O Criador anda entre seus súditos e deixa o próprio sangue como remédio.

Daí, alguém pode pensar: se todo zumbi tem uma chance, deixá-los entregues a própria sorte pode ser considerado tão desumano quanto os atos dos próprio morto-vivo. Na verdade, só quem pensa assim são aqueles que tomaram do antidoto. Alguns já até tomaram, mas não conseguem abandonar sua atitude zumbi.

Sim: haverão sarados com manias esdrúxulas de zumbis, haverão absurdos como gente sadia salivando por um bom prato de carniça, ou ainda cultivar a mania de destruir aquilo que oferece vida como nos velhos tempos.

Não convém mais vestir os farrapos do tempo que andávamos rastejando pelas ruas atrás de um pedaço de cérebro, e aquele cheiro de carne putrefada já não combina mas com os que foram agraciados com vacinas suficientes para si e para distribuir a quem assim quiser aplicá-las.

Muitos zumbis não creem na cura, e muitos, mesmo curados, passaram a crer que a Cura na verdade nunca existiu, e que zumbis são um conto de fadas de um povo sem cultura.

Creio que não gosto de histórias de zumbis por lidar com elas o tempo todo.

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Nota pessoal: texto lúcido e absurdamente verdadeiro. E as razões que fazem o autor desgostar de filmes de zumbis são justamente as que me fazem gostar tanto desse subgênero (desde que bem feitos, claro).